Risco de Infecção

Hospitais com menos recursos e maior risco de infecções: como garantir a segurança mesmo diante das limitações

Garantir a segurança do paciente é um dos maiores desafios dos hospitais brasileiros. Em instituições de grande mais estruturadas e com recursos tecnológicos avançados, protocolos de prevenção de infecções hospitalares já fazem parte do dia a dia, apoiados por equipes especializadas, monitoramento dos indicadores de performance e insumos de ponta.  Mas e nos hospitais com… Continuar lendo Hospitais com menos recursos e maior risco de infecções: como garantir a segurança mesmo diante das limitações

Cris Collina
09/10/2025
6 minutos de leitura

Garantir a segurança do paciente é um dos maiores desafios dos hospitais brasileiros. Em instituições de grande mais estruturadas e com recursos tecnológicos avançados, protocolos de prevenção de infecções hospitalares já fazem parte do dia a dia, apoiados por equipes especializadas, monitoramento dos indicadores de performance e insumos de ponta. 

Mas e nos hospitais com menos recursos, onde muitas vezes faltam equipamentos, insumos básicos e até profissionais capacitados para monitorar processos de higiene e limpeza?

Em um país continental como o Brasil, é certo que muitos hospitais operam com recursos restritos: orçamento reduzido, estrutura precária, insumos escassos e déficit de pessoal treinado. Nessas instituições, a margem para erro é menor — e o risco de infecções hospitalares, muito mais alto, além de complicações, podendo incorrer em óbitos hospitalares. 

Para a enfermeira Regiane Gonzalez Alves, gerente comercial da área de Prevenção de Infecções da Oleak, a boa notícia é que, mesmo diante de restrições estruturais, há caminhos para reduzir riscos e proteger pacientes e equipes.

O peso da desigualdade na segurança hospitalar

No Brasil, segundo o estudo “O Sistema Hospitalar Brasileiro e os Hospitais de Pequeno Porte”, da FGV EAESP, cerca de 87.9% dos hospitais são de pequeno e médio porte. Muitos deles, localizados em regiões periféricas ou cidades menores, enfrentam escassez de insumos, orçamentos reduzidos e alta rotatividade de profissionais. Isso compromete a implementação de práticas de prevenção, como higienização adequada de superfícies, esterilização correta de instrumentais e monitoramento de surtos.

Segundo dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), até 70% das infecções hospitalares poderiam ser prevenidas com medidas simples de higiene das mãos e processos bem estabelecidos. O problema é que, em locais com limitações financeiras e de infraestrutura, mesmo o básico pode se tornar um desafio.

Soluções viáveis em cenários de restrição

Apesar das dificuldades, especialistas em controle de infecções reforçam que a segurança não precisa estar atrelada apenas a investimentos de alto custo. Há práticas que, quando aplicadas com disciplina, trazem impacto imediato:

  • Capacitação constante da equipe: Treinar profissionais para compreenderem a importância da higienização correta é tão essencial quanto o uso de bons produtos. A educação continuada pode ser realizada até mesmo em ciclos curtos, dinâmicos e práticos, com foco em rotinas do dia a dia.
  • Uso racional de insumos: Em vez de multiplicar produtos com funções semelhantes, priorizar soluções multifuncionais pode otimizar o orçamento e garantir resultados de limpeza e desinfecção mais consistentes.
  • Protocolos simplificados: Reduzir a complexidade dos processos, adaptando-os à realidade local, ajuda na adesão da equipe. Protocolos claros, objetivos e viáveis aumentam a chance de aplicação no cotidiano.
  • Monitoramento mesmo sem alta tecnologia: Planilhas simples, listas de verificação e auditorias internas podem substituir sistemas digitais sofisticados, garantindo que a execução seja acompanhada de perto.

Panorama internacional: desigualdade no risco de infecções

No estudo clássico de Allegranzi et al. (2011)Burden of endemic health-care-associated infection in developing countries: systematic review and meta-analysis (Carga de infecção endêmica associada à assistência à saúde em países em desenvolvimento: revisão sistemática e meta-análise), publicado no The Lancet — os autores estimam que a prevalência combinada de infecções hospitalares em países em desenvolvimento gira em torno de 15,5% por 100 pacientes. O estudo ressalta ainda que as infecções de sítio cirúrgico são particularmente frequentes (incidência cumulativa estimada em 5,6 por 100 procedimentos), muito acima dos padrões de países desenvolvidos.

Em outro estudo intitulado Health-care-associated infections in developing countries (Infecções associadas à assistência à saúde em países em desenvolvimento), também publicado no The Lancet, relata que a incidência de infecções associadas à assistência à saúde adquiridas em unidades de terapia intensiva de países em desenvolvimento foi de 34,2 por 1000 pacientes-dia, o triplo das taxas nos Estados Unidos.  

Esses números reforçam que, em contextos de escassez — com menos vigilância, menos insumos e infraestrutura limitada — o risco torna-se exponencialmente maior.

Programas e estratégias da OMS: diretrizes internacionais

Para orientar a atuação dos serviços de saúde, a Organização Mundial da Saúde (OMS) formulou diretrizes robustas de prevenção e controle de infecções (“infection prevention and control” — IPC), especialmente pensadas para adaptar-se a diferentes níveis de recursos. 

A página oficial da OMS sobre os Componentes Centrais para Controle e Prevenção de Infecções resume esses fundamentos e mostra como eles devem ser aplicados em serviços de saúde:

O documento oficial “Guidelines on core components of infection prevention and control programmes” (2016), disponível no site da OMS, explicita os requisitos mínimos e as estratégias para implementação efetiva em hospitais. 

Além disso, a OMS dedica uma seção específica à higienização das mãos como uma pedra angular da prevenção:

  • Os Guias de higiene das mãos na atenção à saúde da OMS contêm recomendações, estratégias multimodais e ferramentas práticas para adoção nos serviços. 
  • E como mencionado anteriormente, programas efetivos de higiene das mãos podem prevenir até 70% das infecções evitáveis e gerar economias médias de custo de cerca de 16 vezes o investimento feito em implementação. 

Também vale notar o artigo Implementation of the infection prevention and control core components at the national level: a global situational analysis (2020) — que examinou 88 países e constatou que, embora muitos hospitais contem com programas de Prevenção e Controle das Infecções, poucos alocam orçamento dedicado ou monitoram conformidades com as diretrizes. 

Evidências nacionais (Brasil) e relevância local

No Brasil, evidências epidemiológicas confirmam que as IRAS são um problema consistente, especialmente em unidades de maior risco como UTIs. No estudo Multi-hospital point prevalence study of healthcare-associated infections in 28 adult intensive care units in Brasil (Estado de Minas Gerais, 2016) (Estudo multi-hospitalar de prevalência pontual de infecções associadas à assistência à saúde em 28 unidades de terapia intensiva adulta no Brasil), Braga et al. (2018), foi identificada prevalência significativa de infecções em UTIs brasileiras, com predominância de bactérias Gram-negativas resistentes e uso intensivo de antimicrobianos.

Outro levantamento nacional Multi-state survey of healthcare-associated infections in acute care hospitals in Brazil (Pesquisa multi-estadual sobre infecções associadas à assistência à saúde em hospitais de cuidados agudos no Brasil (Fortaleza et al., 2017) mostrou heterogeneidade entre regiões e níveis hospitalares, indicando que as taxas de infecção variam intensamente conforme estrutura, gestão local e contexto.

Revisões acadêmicas brasileiras entre 2014 e 2022 destacam obstáculos recorrentes: subnotificação, infraestrutura laboratorial insuficiente, falta de pessoal qualificado para vigilância e dificuldades na governança local para manter programas sustentáveis de IPC.

Um trabalho mais recente Clinical impact of healthcare-associated infections in Brazilian ICUs: a multicenter prospective cohort (Impacto clínico das infecções associadas à assistência à saúde em UTIs brasileiras: uma coorte prospectiva multicêntrica) (Tomazini et al., 2025) — ainda em fase de divulgação em algumas publicações — tem quantificado o peso das IRAS em pacientes críticos no Brasil. O Estudo com 128.247 pacientes em 60 UTIs entre 2019-2023; 3,2% dos pacientes tiveram ao menos uma IRAS na UTI; pacientes com IRAS apresentaram mortalidade hospitalar ~2,4 vezes maior; impacto clínico significativo. 

O papel da indústria no apoio aos hospitais

Empresas especializadas em soluções de higiene e prevenção de infecções, como a Oleak, têm investido em produtos de alta eficácia, biodegradáveis e acessíveis, que atendem desde grandes complexos hospitalares até instituições menores. 

A inovação nesse setor não se limita apenas à formulação de produtos, mas também ao desenvolvimento de programas de treinamento e acompanhamento que orientam gestores e equipes sobre o melhor uso de cada solução.

Regiane reforça que o time de enfermeiras especialistas em Prevenção de Infecções da Oleak realiza, por exemplo, treinamentos com Gamificação em hospitais clientes, além de consultoria para identificação de oportunidades de melhorias. Durante estes trabalhos, a escuta ativa é fundamental para identificar novas oportunidades para a área de inovação para novos produtos ou para a melhoria de produtos existentes ou de processos, fundamental para que a parceria aconteça e prospere para ambos.

Além disso, essa proximidade é fundamental para equalizar desigualdades, garantindo que hospitais com menos recursos também tenham condições de oferecer um ambiente seguro.

Segurança como direito universal

Em saúde, a equidade passa por reconhecer que a prevenção de infecções não pode ser privilégio de poucos hospitais de referência. Cada paciente, independentemente do local onde é atendido, deve ter assegurado um cuidado seguro.

Investir em educação, protocolos adequados à realidade local e soluções acessíveis é, hoje, o caminho mais efetivo para reduzir riscos em ambientes hospitalares de baixa e média complexidade. 

Afinal, segundo Regiane quando se fala em infecções hospitalares, prevenir continua sendo a estratégia mais barata e eficaz — e deve ser tratada como prioridade, mesmo onde os recursos são escassos.

Referências 

BRAGA, I. A. et al. Multi-hospital point prevalence study of healthcare-associated infections in 28 adult intensive care units in Brazil. American Journal of Infection Control, v. 46, n. 7, p. 703–709, 2018. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29522784/. Acesso em: 4 out. 2025.

BRASIL. Nações Unidas no Brasil. Boas práticas de higiene podem evitar 70% das infecções hospitalares. Brasília, 2022. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/181015-boas-pr%C3%A1ticas-de-higiene-podem-evitar-70-das-infec%C3%A7%C3%B5es-hospitalares. Acesso em: 4 out. 2025.

FORTALEZA, C. M. C. B. et al. Healthcare-associated infections among patients in Brazilian hospitals: results of a multicenter prevalence study. Revista de Saúde Pública, São Paulo: Universidade de São Paulo, 2017. Disponível em: https://repositorio.usp.br/item/003005160. Acesso em: 4 out. 2025.

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ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Core components for infection prevention and control programmes at the national and acute health care facility level. Geneva: WHO, 2016. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241549929. Acesso em: 4 out. 2025.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Improving infection prevention and control in health care: implementation guidance. Geneva: WHO, 2021. Disponível em: https://iris.who.int/server/api/core/bitstreams/d811a2ad-3c7f-48a2-b88b-4935da71a87b/content. Acesso em: 4 out. 2025.

PITTET, D. et al. Evidence-based model for hand transmission during patient care and the role of improved practices. The Lancet Infectious Diseases, v. 10, n. 10, p. 641–652, 2010. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(10)61458-4/abstract. Acesso em: 4 out. 2025.

PITTET, D.; DONALDSON, L. Clean care is safer care: a worldwide priority. The Lancet, v. 366, n. 9493, p. 1246–1247, 2005. Disponível em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(10)62005-3/abstract. Acesso em: 4 out. 2025.

TOMAZINI, B. M. et al. Clinical impact of healthcare-associated infections in Brazilian ICUs: a multicenter prospective cohort. Critical Care, v. 29, n. 1, p. 112, 2025. Disponível em: https://ccforum.biomedcentral.com/articles/10.1186/s13054-024-05203-8. Acesso em: 4 out. 2025.

ZHANG, Y. et al. Prevalence of healthcare-associated infections and antimicrobial use in acute care hospitals: a global survey. Journal of Hospital Infection, v. 106, p. 178–186, 2020. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0195670120305491. Acesso em: 4 out. 2025.

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