Escutar para transformar: a virada cultural no Facilities Management brasileiro
No Facilities Management, a escuta ativa diferencia fornecedores de parceiros estratégicos. Saiba como transformar feedback em inovação sustentável e impactar a experiência do usuário.
Cris Collina
26/08/2025
Quem olha de fora costuma enxergar o Facilities Management (FM) como algo quase invisível: presente em escritórios, hospitais, escolas, shoppings, mas raramente protagonista. No entanto, esse mercado no Brasil já movimenta bilhões em contratos, milhares de empregos diretos e indiretos e tem impacto direto na experiência de quem ocupa os espaços.
Nos últimos anos, o setor passou por uma transição importante: deixou de ser visto apenas como despesa de apoio para se afirmar como parte estratégica das organizações. É nesse cenário que a escuta ganha relevância.
Escutar não é um gesto passivo; é transformar demandas em soluções, reduzir desperdícios, inovar em processos e, sobretudo, construir parcerias em vez de simples transações comerciais.
Esse foi o tom do 4º webinar da série “A voz do FM na inovação: como transformar escuta em resultado”, promovida pela Oleak. Depois de encontros que revisitaram a história, a profissionalização da área e o papel estratégico do gestor, esta edição trouxe um amadurecimento: como ouvir — e agir a partir disso — pode redefinir a forma como fornecedores, gestores e usuários se relacionam.
Fornecedor ou parceiro? O dilema do preço x confiança
Celso Toshio Saito, especialista em FM, abriu a conversa lembrando um dilema comum: escolher fornecedores pelo menor preço. À primeira vista, parece vantagem. Na prática, significa abrir mão de qualidade, previsibilidade e inovação.
“Um parceiro enxerga o problema antes de ele aparecer. O fornecedor entrega só o que está no contrato”, resumiu Celso.
O barato pode até parecer vantajoso na planilha, mas é a confiança que sustenta a operação diante dos imprevistos.
É uma mudança cultural: mais do que cortar custos, o FM precisa construir parcerias sólidas. Isso exige escuta ativa em duas vias — o fornecedor captando sinais da operação e o gestor reconhecendo seus próprios gaps para alinhar expectativas com clareza.
Quando ouvir vira experiência
Na sequência, André Fonseca, gerente de Performance & Growth da Oleak, trouxe outro olhar: o valor percebido.
“Não vendemos apenas uma embalagem de cera. Vendemos o piso bonito, seguro, que transmite bem-estar.”
A fala mostra como o FM evoluiu do “item” para a experiência. É a diferença entre medir litros consumidos e medir a satisfação de quem circula pelo espaço. Para isso, escutar é essencial: só pela escuta se descobrem as dores invisíveis e se oferecem soluções que realmente importam.
O vendedor, assim, deixa de ser apenas fornecedor de insumos e passa a atuar como consultor de soluções — conectando necessidades do cliente com resultados concretos como produtividade, segurança e bem-estar.
Do improviso à maturidade: um olhar histórico
Ely Fonseca, vice-presidente da Oleak, ampliou o panorama com uma linha do tempo. Ele lembrou os anos 90, quando produtos domésticos eram adaptados para shoppings, hospitais e cozinhas industriais. O resultado era improviso: soluções feitas para casas sendo usadas em ambientes de altíssimo fluxo.
Hoje, o cenário é outro: qualidade do ar, sustentabilidade, métricas de custo por metro quadrado limpo e bem-estar do usuário se tornaram centrais. Esse amadurecimento foi impulsionado por dois fatores:
- Profissionalização do FM, que passou a exigir soluções técnicas reais.
- Mudança cultural dos consumidores, especialmente após a pandemia, que elevou a consciência sobre ambientes saudáveis e seguros.
Mas Ely fez um alerta: “Enquanto a métrica principal do mundo for consumo, estamos apenas ganhando tempo, não resolvendo o problema.” Ainda assim, ele enxerga sinais de mudança: uma nova geração mais consciente já busca soluções sustentáveis. Nesse espaço, o FM brasileiro tem a chance de se reinventar.
Do insight à patente: o case dos dosadores
Um exemplo prático da força da escuta ativa veio com o desenvolvimento do Sistema Automático de Dosagem (SAD).
Durante uma reunião com gestores de shoppings, foram analisados diferentes sistemas de diluição. Ao final, um gestor comentou quase de forma despretensiosa:
“Melhor mesmo seria abrir qualquer torneira do shopping e já sair produto de limpeza diluído.”
A frase virou gatilho para inovação. A Oleak adaptou a lógica dos dosadores de parede para a tampa dos frascos, permitindo que qualquer torneira se tornasse um ponto de diluição. O resultado: uma patente de sucesso, sustentável e simples — nascida da escuta verdadeira.
Um fio que conecta passado, presente e futuro
O interessante é perceber como as falas formaram uma linha contínua. Celso trouxe o olhar da prática diária, André mostrou como ela se traduz em valor e Ely colocou tudo em perspectiva histórica e suas perspectivas para o futuro. Juntos, apontam para o mesmo ponto: escutar abre caminho para a inovação.
Escutar gestores para compreender suas dores reais.
Escutar usuários para entender como os espaços impactam sua experiência.
Escutar fornecedores para cocriar soluções.
Escutar o mercado para antecipar tendências.
Se antes o preço era praticamente o único critério, hoje a escuta verdadeira cria um ciclo virtuoso:
- FM compreende seus gaps →
- Parceiros traduzem necessidades em soluções inovadoras →
- Operações tornam-se mais eficientes, seguras e sustentáveis →
- Usuário final tem melhor experiência.
Esse amadurecimento conecta os temas dos webinars anteriores com um novo patamar: se antes o desafio era consolidar identidade e papel estratégico, agora é evoluir pela qualidade das relações.
A revolução silenciosa do FM
O FM brasileiro está no meio de uma virada cultural. De um lado, ainda convive com resquícios do improviso e da busca pelo menor preço. De outro, começa a desenhar um futuro em que confiança, sustentabilidade e bem-estar definem o sucesso das operações.
E, como mostrou o webinar, essa virada não depende apenas de tecnologia ou grandes investimentos. Depende de algo ao alcance de todos: a escuta ativa.
Escutar não para responder rápido, mas para compreender profundamente. Escutar não como formalidade, mas como estratégia. Escutar para transformar.
É uma revolução silenciosa — mas capaz de redefinir não só o FM, como também a forma como milhões de brasileiros vivem e trabalham nos espaços do dia a dia.